tudo sobre a
umbanda
Umbanda é uma religião afro-brasileira que sintetiza o culto aos Orixás e aos demais elementos das religiões africanas, em especial Iorubá, com indígenas e cristãs, porém sem ser definida por eles.[2]
Estruturada como religião no início do século XX em São Gonçalo, Rio de Janeiro, a partir do sincretismo entre candomblé, o catolicismo e o espiritismo que já se vinha operando ao longo do final do século XIX em quase todo o Brasil. É considerada uma “religião brasileira por excelência” caracterizada pela síntese entre a tradição dos orixás africanos, os santos católicos e os espíritos tradicionais de origem indígena.[3][4]
O dia 15 de novembro é considerado a data do surgimento da Umbanda como religião organizada,[5][6] e foi oficializado no Brasil em 18 de maio de 2012 pela Lei 12.644.[7] Em 8 de novembro de 2016, após estudos do Instituto Rio Patrimônio da Humanidade (IRPH), a umbanda foi incluída na lista de patrimônios imateriais do Rio de Janeiro por meio de decreto.
Etimologia
“Umbanda” ou “Embanda”[9] são oriundos da língua quimbunda de Angola, significando “magia”,[4] “arte de curar”.[10] Há também a suposição de uma origem em um mantra na língua adâmica cujo significado seria “conjunto das leis divinas”[11] ou “deus ao nosso lado”.[6]
Também era conhecida a palavra “mbanda” significando “a arte de curar” ou “o culto pelo qual o sacerdote curava”, sendo que “mbanda” quer dizer “o Além, onde moram os espíritos”.[12]
Já as vertentes caracterizadas pela negação de alguns elementos africanos, como a Umbanda Branca, declarou após o I Congresso do Espiritismo de Umbanda de 1941[13] que “Umbanda” vinha das palavras do sânscrito aum e bhanda, termos que foram traduzidos como “o limite no ilimitado”, “Princípio divino, luz radiante, a fonte da vida eterna, evolução constante”.
História
Século XVII – Calundu dos escravizados
As primeiras comunidades religiosas afro-brasileiras que se têm documentadas surgiram ainda no século XVII. É provável que a mais antiga documentação de práticas rituais africanas no Brasil seja uma pintura de Zacharias Wagener datada, no mais tardar, de 1641[15]. Praticadas pelos escravos, essas comunidades religiosas e suas práticas de culto ficaram conhecidas como Calundu.[16] Os Calundus surgiram a partir das chamadas rodas de batuques, onde os escravos dançavam, tocavam atabaques em seus momentos de folga ao redor das senzalas.[16] Eram ostensivamente perseguidos pelas autoridades civis e colonizadores portugueses.[17] Existia no Calundu o sincretismo entre as crenças africanas, com Pajelança indígena e Catolicismo.[16]
Um documento da Inquisição Portuguesa de 1646 demonstra a presença de um sacerdote de Angola atuando na Capitania da Bahia de Todos os Santos, chamado Domingos Umbata, e descreve uma Gira de Inquice numa sessão de Calundu: “[…] Com uma tigela grande cheia de água, com muitas folhas e uma cascavel, um dente de onça, viu a testemunha algumas negras que se estavam lavando naquela tigela para abrandar as condições de suas senhoras” e outra noite foi à sua casa, pela meia noite ver “uma grande bula e matinada com muita gente e ele só falava língua que ele (o denunciante) não entende”. Na tigela com água punha também carimã, com a qual fazia uma cruz e círculo à volta, depois botava-lhe uns pós por cima e a mexia com uma faca e ficava fazendo como se estivera ao fogo e inclinando-se sobre a tigela, falava com ela, olhando de revés para as negras presentes em sua língua […]“[18].
O Calundu vai se dividir em duas vertentes importantes: a Cabula e o Candomblé Bantu ou Angola.[19] A Cabula sincretizava as crenças africanas do Calundu com o catolicismo, pajelança indígena — sincretismo já existente no Calundu — e espiritismo kardecista.[17] Com o crescimento do número de escravos vindos de diversos lugares, o Calundu passa a ser cultuado de forma mais elaborada, dando início ao Candomblé, que manteve o ritualismo Bantu, com uma fraca sincretização com Catolicismo.[19][20]
Com a chegada dos povos Iorubás, quetos, Oiós, Ijexá, Ijebu Odé, Ibadan, Egbás e Jejes que desejavam preservar com mais intensidade os elementos ritualísticos africanos de seus territórios de origem, — mas sem deixarem de utilizar o sincretismo católico como forma de se livrarem das perseguições feitas pelos colonizadores e pelas elites dominantes, — surgem as demais linhas do candomblé, como o Candomblé-Ketu e o Candomblé-Jeje.[21] Com o tempo, os templos de cabula e banto que não aderiram aos sincretismos e às influências jejê-nagô existentes na sua versão fluminense, passam a dar origem aos terreiros de Umbanda Angola e Almas e Umbanda Omolokô.[17]
Século XVII a XIX – A Cabula
Muitos estudiosos remontam as origens da Umbanda, de forma prática, aos rituais dos antigos centros de Cabula, conhecidos popularmente como “Macumba” já existentes desde o século XVIII.[22] Populares no Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo, São Paulo e Bahia, muitos terreiros de Cabula já sincretizavam rituais africanos com catolicismo e crenças indígenas.[23] Daí, Zélio Fernandino de Morais adapta rituais desses terreiros sob uma roupagem espírita kardecista, dando surgimento a Umbanda como religião organizada, que depois se conhece por Umbanda branca e demanda.[22] Os terreiros das zonas rurais e periferias urbanas conhecidos como Macumba Popular, e ainda hoje como Umbanda Popular, descendem dos terreiros de Cabula que não foram absorvidos pelo espiritismo de Zélio.[23] Alguns ritos umbandistas como Omolocô, Almas e Angola também surgiram a partir desses terreiros de Cabula, mas absorvendo mais influências do Candomblé.[23] A Cabula se dividiu em dois grupos principais:
- Cabula Bantu: surgiu em meados do século XIX, em Minas Gerais e na Bahia e é descendente direta do Calundu praticado pelos escravizados.[17] Espalhou-se pelos estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo, onde sofreu perseguição das elites cristãs até os dias de hoje.[17] A Cabula Bantu sincretizava o Calundu, a religião Bantu, com elementos do catolicismo, crenças indígenas e, já nas últimas décadas do século XIX, espiritismo.[17]
- Macumba Popular: surgiu no final do século XIX, no Rio de Janeiro e espalhou-se rapidamente em São Paulo e Espírito Santo.[17][24] Essa Macumba Popular do Rio diferenciava-se da Cabula Bantu de Minas e Bahia pela influências do ritualismo e práticas jejê-nagô e do esoterismo europeu através de publicações como O Livro de São Cipriano da Capa Preta.[17] Tanto no Rio de Janeiro, como em São Paulo e no Espírito Santo, a Macumba agregava em si elementos religiosos dos mais variados tipos e origens como as crenças já populares no Brasil, as luso-brasileiras, as árabes, as francesas, as ciganas, as hebraicas e tantas outras oriundas de várias partes do mundo.[17] A Macumba era altamente sincrética ao agregar em si diversas concepções religiosas e diversidade ritualística nos terreiros.[17]
Por conta de seu sincretismo, esta Macumba Popular era frequentada por parte da elite como também pelas classes menos favorecidas e pessoas de diversas religiões e origens.[17][25] O jornalista João do Rio falará a respeito disso: “A mistura na Macumba não estava presente somente nos mitos, ritos e doutrinas, mas também, estava no campo social que era totalmente heterogêneo. Frequentavam seus cultos pessoas de diversos níveis da sociedade, misturando-se no mesmo espaço, grandes empresários, altos funcionários do governo, delegados e policiais, com simples operários, favelados, ladrões, bandidos, assassinos, malandros gigolôs e homossexuais. Senhoras e moças brancas da alta sociedade com as domésticas pretas e as prostitutas.”[26] Desta Macumba se dividirão dois grupos principais: um atrelado ao espiritismo kardecista, que irá abolir alguns elementos bantu e iorubás, como o sacrifício de animais e o uso de atabaques, dando origem à Umbanda branca e demanda, de Zélio; e outro, a Umbanda Popular, que continuou seu curso normal, mas relegado à marginalidade pela classe média e alta.[16]